Thursday, November 16, 2006

Presidencialismo não é consenso

Querer fazer reunião com 27 governadores e tentar resolver alguma coisa por consenso é a mesma coisa que tentar acertar com 27 pessoas o quanto cada uma vai ganhar de salário: nunca vai dar certo.
Quem elegeu Nosso Guia o elegeu pra ver se ele resolve alguma coisa. Mas parece que ele não vai resolver nada.

Dora Kramer, Estado de S. Paulo, 16/11/2006, A4

Manchete da edição de ontem do Estado informa que o presidente Luiz Inácio da Silva pretende convidar os governadores eleitos e reeleitos em outubro para participar do programa econômico a ser posto em execução em 2007. Louvável como intenção, a idéia é daquelas fadadas a cair no vazio sem gerar conseqüência prática.

Por um motivo muito simples: compartilhar programa econômico com os 27 governadores é mais ou menos como querer governar em regime de assembléia permanente - não leva a nada e paralisa decisões.

Se a proposta for levada adiante, não passará de um lance de efeito. É claro que a maioria dos governadores vai aceitar correndo, mas cada um levará consigo debaixo do braço sua própria pauta de reivindicações e no tocante à reforma tributária só vão querer saber de pleitear uma repartição mais equânime da arrecadação de impostos, hoje com uma concentração da ordem de 82% nas mãos da União.

O governo federal estará disposto a abrir mão de dinheiro? Nem este nem qualquer outro. Sempre dão, aos Estados e municípios e também ao cidadão, a mesma resposta dada agora pelo ministro da Fazenda, Guido Mantega: no futuro, talvez.

Portanto, se o presidente Lula não tiver sua própria proposta, não disser que política é essa 'mais ousada' que propugnou quando considerou 'tímidas' as sugestões feitas por sua equipe econômica na reunião de segunda-feira, estará abrindo mão de sua condição de árbitro no ato de governar e, no lugar de conduzir o debate, acabará sendo conduzido por ele. E para não chegar a lugar algum, além de uma discussão longa, desgastante e sem conclusão.

Política econômica é tema sensível e importante o bastante para não ser objeto de intenções difusas e palavras vãs como as que acompanharam a rejeição do presidente às orientações da equipe econômica. Ele quer 'crescer' de qualquer jeito, propôs para isso 'ousadia', mas não explicou exatamente o que quis dizer nem os participantes da reunião pareceram saber qual mesmo seria a alternativa à receita atual.

É possível que haja, deve haver. Mas para que seja encontrada é preciso mais que um discurso enfático.

Dois exemplos: o Plano Real só virou alguma coisa objetiva depois de um ano de discussões intensas de um grupo de economistas postos para pensar; outro exemplo, não tão bem-sucedido como aquele, é o da reforma tributária, alvo de muitos debates e detalhados estudos durante os dois anos da Assembléia Nacional Constituinte, ao fim dos quais chegou-se a um modelo imperfeito.

Não será transferindo a tarefa para os governadores - cada qual preocupado com o interesse de seu Estado - que o governo federal obterá resultado melhor.

Chegará, no máximo, próximo ao molde do inútil Conselho de Desenvolvimento Econômico e Social criado em 2003 com a expectativa de ser o grande fórum de participação da sociedade nas decisões do governo e resultou em nada.

A última reunião do chamado 'Conselhão' aconteceu no início da semana para discutir uma proposta de reforma política e chegou a duas conclusões: a convocação de um novo encontro para dezembro e a constatação de que o debate precisa ser ampliado. Que tal?

O mesmo ocorrerá com o fórum de governadores se o presidente levar adiante a idéia de fazer da política econômica uma pauta a ser debatida em regime de assembléia permanente de interesses conflitantes.

1 Comments:

Blogger Mônica said...

adorei o link...bj

7:38 AM  

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